Exportar 2020

O último ano parece ter encerrado com um novo recorde exportador. Assim mostram os dados provisórios do comércio internacional português relativos a 2019 que apontam para mais de 90 mil milhões de euros em exportações (44% do PIB nacional). Um novo recorde é certo, mas que deve ser encarado com cautela, uma vez que esconde uma desaceleração no ritmo de crescimento das nossas exportações.

De acordo com os dados recentemente avançados pelo INE (7-Fev.), no conjunto de 2019 as vendas nacionais ao exterior terão aumentado 3,6% relativamente ao ano anterior. No entanto, em 2018, a subida das exportações havia sido de 5,1% e em 2017 de 10%. Já as importações de bens, estima-se que tenham subido 6,6%, depois de em 2018 o crescimento ter sido de 8,1%. Os dados são claros. O comércio internacional português continua a crescer, mas a um ritmo mais lento e com um maior dinamismo do lado das importações, tendo o défice da balança comercial de bens aumentado 2,842 mil milhões de euros.

Portugal é um país com um mercado interno pequeno, onde as exportações têm dado um contributo central para o crescimento económico registado nos últimos anos. É por isso fundamental para a economia portuguesa não deixar acentuar esta tendência que os números agora divulgados parecem sugerir.
Mas estabelecer um novo recorde em 2020 será uma missão difícil, tendo em conta os desafios que se avizinham. Desafios que não são novos – alertámos, aliás, para muitos deles logo no início de 2019 – mas que em alguns casos poderão acentuar-se no ano corrente.

Desde logo a desaceleração dos três grandes blocos económicos mundiais – EUA, China e União Europeia (UE) –, responsáveis por mais de 62% do PIB mundial e mais de metade dos fluxos comerciais.

O peso sistémico de economias como a dos EUA e a da China é por si só revelador dos riscos que perturbações nestes mercados podem significar para os restantes parceiros internacionais. Os efeitos da “guerra comercial” entre Washington e Pequim sentidos ao longo do último ano em muitas economias europeias é disto um reflexo bastante claro.

No caso concreto da UE, a exposição de Portugal às diferentes dinâmicas europeias poderá fazer-se sentir de forma ainda mais directa.

 

O problema da concentração europeia

Entre importações e exportações, cerca de 75% das trocas comerciais de Portugal faz-se dentro do espaço comunitário, com Espanha, Alemanha, França, Itália, Holanda e Reino Unido (RU) a figurarem desde há muito como os mais importantes parceiros comerciais do nosso país. Entre eles, Espanha, França, Alemanha e RU representaram em 2018 quase 56% do total das exportações portuguesas. Se a este este grupo juntarmos os EUA (5º maior mercado de destino nas nossas exportações) aquele valor ultrapassa os 60%. Neste quadro, factores como a instabilidade política em Espanha, a forte agitação social em França – num ano marcado pela vaga de contestações protagonizada pelos “coletes amarelos” – o novo ciclo político numa Alemanha pós-Angela Merkel e as incertezas em torno do resultado das negociações visando a saída do RU do bloco comunitário, não deixaram de afectar a performance comercial portuguesa.

Para 2020, ainda que não existam estimativas de recessão relativas a qualquer um destes mercados, a simples desaceleração nos seus ritmos de crescimento (pela primeira vez neste século, Espanha, por exemplo, está a crescer menos do que Portugal) e as dúvidas quanto à sustentabilidade das soluções políticas encontradas para cada uma das situações neles vividas, podem ter impacto nas nossas exportações.

Mas mesmo que não se concretizem os cenários mais pessimistas, em qualquer circunstância é importante não estar excessivamente dependente de um só cliente, de um único mercado. A diversificação é por isso fundamental. Muitas empresas já o sabem, mas é necessário fazer mais.

 

Diversificar para vingar

O alargamento da carteira de clientes/mercados tem vindo a ser feito, porém a uma intensidade talvez não suficiente para fazer crescer as exportações ao ritmo que a economia precisa. Existe um consenso generalizado que atravessa todo o espectro político nacional em torno do objectivo de até meados da presente década as exportações atingirem 50% do PIB. Uma meta estabelecida com base numa visão muito realista quanto à necessidade de captação de recursos externos, de crescer em função da procura externa e assim diminuir progressivamente o peso da dívida pública.

Neste esforço de diversificação, naturalmente que os mercados europeus não devem ser descurados, desde logo porque são geograficamente mais próximos, não apresentam risco cambial. O Velho Continente continua a ser vital para o comércio internacional português. Sê-lo-á sempre. Mas é necessário chegar mais longe e mais depressa aos mercados extra-UE, da Ásia às Américas, passando por África e pelo Médio Oriente, onde se preveem ritmos de crescimento mais elevados, ainda que não sejam destinos de excelência das exportações portuguesas.

Numa tentativa de ajudar as empresas exportadoras neste esforço de diversificação, será lançado, ainda neste primeiro trimestre de 2020, a discussão sobre um novo programa de internacionalização, procurando responder às debilidades centrais do sector exportador nacional. Entre elas, a necessidade já identificada de aumentar o acesso das empresas a instrumentos de business intelligence e research especializado que ajude a diversificar clientes, mercados e geografias.

Está também previsto o fim do imposto de selo nas garantias de Estado prestadas para os seguros de crédito à exportação e incentivos fiscais, cumulativos com outros instrumentos, para quem faz promoção externa e dos seus produtos e serviços fora da UE.

Não menos importante, reforçar a base do sector exportador com mais competências em comércio internacional, i.e., mais quadros qualificados que saibam transacionar em mercados internacionais. Para o efeito, está previsto, também já para 2020, o lançamento de centros de formação e qualificação devidamente certificados, centrados no comércio internacional, particularmente dirigidos às PME e que deverão funcionar com o apoio das associações empresariais.

Num mundo cada vez mais digitalizado, o comércio electrónico assumirá um papel cada vez mais importante como ferramenta de exportação, permitindo chegar mais facilmente a mais e a mercados mais longínquos, funcionando também como instrumento de diversificação. Mas Portugal é dos países europeus onde menos se vende por e-commerce, quer no plano interno, quer nos mercados externos, algo que a não ser corrigido pode ser fatal para o objectivo estratégico de aumento das exportações. Sujeitas a uma concorrência externa por norma bastante forte, as empresas exportadoras portuguesas têm de se apetrechar para concorrer internacionalmente, muitas vezes em mercados altamente sofisticados, e ganhar a batalha do comércio digital é hoje imperativo, principalmente no quadro da diversificação de mercados para fora do espaço europeu, chegando a um universo crescente de web buyers internacionais.

Os desafios para exportar em 2020 são muitos e nem todos são novos. As vias a seguir e os instrumentos a usar para lhes dar resposta, esses sim, têm de ser cada vez mais inovadores. Foram aqui referidos alguns. Muito mais haverá a pensar para encontrar tantos outros. Qualquer que seja a estratégia seguida, e tal como temos vindo a alertar, a diversificação dos mercados de exportação deve ser uma prioridade para as empresas exportadoras nacionais.

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