Reformas económicas, uma classe média em significativa expansão, uma enorme diversidade de recursos naturais e potencial de crescimento económico, são alguns dos factores que têm vindo a tornar mercados africanos de língua portuguesa focos crescentes de investimento estrangeiro no continente, principalmente no contexto da nova Área de Livre Comércio Continental Africana (ZCLCA).
Assinado em Março de 2018, em vigor desde 30 de Maio deste ano, este é um acordo que tem por objectivo criar, de forma faseada, a maior zona de livre comércio do mundo, unindo 55 economias africanas, com um PIB combinado de USD 3,4 mil milhões e um mercado avaliado em 1,2 mil milhões de consumidores. Uma zona de livre comércio com potencial para ser o catalisador da criação e/ou maior desenvolvimento de indústrias nacionais e geração de cadeias de valor inseridas no contexto regional e continental, assim ajudando o mercado africano a melhor posicionar-se no quadro mais vasto do comércio e investimento internacional.
Reduções tarifárias em 90% de bens transaccionáveis, liberalização do comércio de serviços, definição de regras claras de origem, identificação de barreiras não alfandegárias são algumas das metas a atingir, complementadas, em fase posterior, pela livre circulação de mão-de-obra, capitais e, por fim, a criação de uma união monetária.
A par da ZCLCA, novas ferramentas como o “Pacto de Financiamento para o Desenvolvimento dos Países Lusófonos em África” – também assinado em 2018, envolvendo o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), Portugal, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e a Guiné Equatorial e que tem por fim acelerar o crescimento do sector privado nestes mercados a partir de instrumentos financeiros disponibilizados pela instituição bancária africana, pelo Estado português e por outros parceiros dos 6 países lusófonos - dão aos investidores e credores mais confiança para entrar nestes mercados lusófonos.
Desde a Guiné-Equatorial, país com o mais alto PIB per/capita do continente, a economias que apresentam das mais baixas rendas em toda a África, de Angola e Moçambique, com populações acima dos 30 milhões, a mercados como São Tomé ou Guiné-Bissau com menos de 1 milhão, geografias que se estendem de Este a Oeste, do Sul às zonas mas próximas do centro africano, estes são mercados caracterizados por uma enorme diversidade.
Mas são também países que partilham características importantes. Têm uma herança e língua comuns. Enquanto Estados independentes, promoveram laços comerciais particularmente fortes com Portugal e, mais recentemente, com o Brasil. E todos eles reconhecem a necessidade e têm feito esforços, com maior ou menor dificuldade e com diferentes graus de sucesso, com vista ao crescimento do sector privado nas respectivas economias. E este é um dos grandes desafios pela frente.
Estamos perante mercados onde o sector privado ainda é confrontado com sérios obstáculos ao seu desenvolvimento: dificuldades em obter financiamento; máquinas burocráticas pesadas; dificuldades logísticas; constrangimentos legais; infra-estruturas deficientes; obstáculos ao repatriamento de capitais, são apenas alguns exemplos. Mas a boa notícia é que todos eles parecem estar determinados em lidar com estas questões, através de reformas verdadeiramente estruturais, com a ajuda de parceiros internacionais, desde logo do BAD que nos tempos mais recentes tem demonstrado especial interesse nos mercados da lusofonia.
Em Novembro de 2017, o presidente do BAD, Akinwumi Adesina, deslocou-se a Lisboa para discutir de que modo a sua instituição e as autoridades portuguesas poderiam começar a trabalhar de forma mais integrada. Das reuniões então havidas, surgiria uma visão comum sobre uma nova parceria a ser estabelecida entre as partes, aberta igualmente a terceiros – o já referido “Pacto de Financiamento para o Desenvolvimento dos Países Lusófonos em África”, assinado no final de 2018, e integrado naquele que é comumente conhecido como “Compacto Lusófono”.
Como funciona? Trata-se de um mecanismo marcadamente orientado para a obtenção de resultados práticos no terreno, focando-se em dois tipos de intervenção: financiamento e mitigação de risco, direccionados quer para investimentos privados, quer para parcerias público-privadas nos PALOPs; e projectos de assistência técnica que ajudem à operacionalidade do sector privado, nomeadamente em matéria de preparação de projectos e sua implementação concreta no local. São sempre necessários “Compactos” para cada país em concreto, com metas objectivamente definidas para cada um dos países signatários.
Portugal disponibilizou, só para o ano de 2019, € 400 milhões em garantias para apoiar o financiamento do BAD, que contribui, ele mesmo, com financiamento próprio e outros recursos alocados à administração do Compacto Lusófono. É importante ressaltar, que os PALOPs são parceiros-iguais nesta iniciativa, e têm de fazer a sua parte para viabilizar os investimentos externos canalizados. O próprio Compacto procura alavancar os investimentos intra-PALOPs e a partilha de melhores práticas. Acrescem, os esforços feitos pelo BAD no sentido de encorajar Estados terceiros e outras entidades fornecedoras de financiamento a integrarem este projecto.
Tudo isto leva-nos de volta ao ponto inicial: este é o momento para investir na África Lusófona.
Em Angola está em curso um ambicioso programa para diversificar a economia, tornando-a menos dependente do sector do petróleo, e para melhorar o ambiente de negócios no país, objectivo para o qual têm sido vitais as medidas de combate à corrupção e saneamento das finanças públicas. Moçambique, que começa a receber grandes investimentos relacionados com a prospecção e exploração de gás natural, também reconhece a necessidade de desenvolver a sua indústria, o sector agro-industrial, promovendo a criação de emprego. Em Cabo Verde, um país já de rendimento médio, são igualmente visíveis os esforços de diversificação económica – atraindo novos tipos de turistas e procurando desenvolver o sector agrícola, agro-industrial e das pescas. São Tomé e Príncipe e a Guiné- Bissau, membros da Aliança dos Pequenos Estados Insulares, procuram investimentos sustentáveis que promovam o crescimento, ao mesmo tempo que mitigam a sua exposição aos efeitos das alterações climáticas, nomeadamente através do desenvolvimento da “economia azul”.
Todos estes países estão determinados a aumentar os fluxos de comércio e investimento entre si, com os países das regiões em que se inserem – e que em alguns casos incluem as maiores economias do continente – assim como com mercados extra-africanos.
O Fórum Africano de Investimento (também iniciativa do BAD), que conheceu mais uma edição nos passados dias 11-13 Novembro, na África do Sul, foi uma montra privilegiada para os mercados lusófonos apresentarem as suas oportunidades de negócio – tendo este ano contado com um painel específico sobre Investimentos na África Lusófona onde foram destacadas essas mesmas oportunidades - num contexto em que África se mostra ao mundo como destino de investimento com crescente potencial. O mundo viu e ouviu. Pese embora dificuldades políticas e económicas que não deixam de afectar, em diferentes medidas, alguns desses países, as empresas portuguesas também não podem deixar de o fazer.