Apesar da descida do preço de petróleo que vinha sendo registada desde Junho de 2014 – altura em que o petróleo era negociado a 115 dólares/barril – a OPEP decidiu, em Novembro desse ano, manter inalteradas as quotas de produção do petróleo, levando a que a quebra do seu preço no mercado internacional se tornasse ainda mais acentuada: uma quebra na ordem dos 50%, com o petróleo a ser negociado abaixo dos 50 dólares no início de 2015.
Se para os importadores isto foram boas notícias, podiam comprar a mais baixo preço, para os exportadores o quadro foi bem diferente. O impacto da quebra da cotação internacional do crude sentiu-se, de uma forma geral, em todas as economias exportadoras de petróleo. No entanto, ele foi bastante mais acentuado e com consequências muito mais graves nas economias não diversificadas, demasiadamente dependentes deste sector. Este foi e é o caso de Angola.
Angola sofreu um choque económico-financeiro por força do enorme peso do petróleo na sua economia: 95% das exportações, 40 a 45% do PIB e cerca de 70% das receitas do Estado (2014).
A quebra da cotação internacional do crude levou a uma forte redução das receitas do Estado, estimadas no orçamento para 2015 em 71 mil milhões de dólares. Provocado por um cálculo orçamental assente em projecções de venda de petróleo a 81 dólares, e não a 48 dólares o barril – valor registado no final de Janeiro deste ano, surgiu, assim, um verdadeiro “buraco orçamental” que obrigou a cortes, reajustamentos e várias outras medidas de redução da despesa pública para compensar a diminuição das receitas.
A crise instalada estendeu-se rapidamente a toda a economia, às empresas e aos investidores, que hoje se deparam com enormes dificuldades, com contratos a serem cancelados, grandes projectos de construção de infra-estruturas suspensos, atrasos e dificuldades nos pagamentos. Uma realidade que afecta sobremaneira muitas empresas portuguesas a operarem em Angola e com reflexos no mercado laboral.
A situação macroeconómica do país foi ainda mais agravada pela desvalorização do kwanza (moeda nacional) face ao dólar e pela diminuição das reservas de divisa estrangeira, crucial para o pagamento das importações. A crise económica tornava-se também uma crise financeira e cambial.
É este o quadro que justifica um conjunto de novas políticas e medidas tomadas, das quais podem ser destacadas:
- A revisão orçamental, efectuada logo em Março e que, entre outras alterações, propõe a aplicação de um imposto às transferências internacionais visando evitar a saída de moeda estrangeira do país e um aumento de impostos relativos à importação de bens de luxo;
- O aumento da dívida pública, enquanto mecanismo de obtenção de recursos financeiros. Dados do Banco Nacional de Angola sobre a evolução dos mercados monetário e cambial revelam que, só na primeira semana de Setembro, foi colocada no mercado dívida pública num total de cerca de 63 milhões de euros, valor que triplicou na semana seguinte e que, entre títulos do tesouro, obrigações do tesouro e venda directa de títulos ao público, totalizou aproximadamente 190 milhões de euros;
- A procura de fontes adicionais de liquidez externa, uma nova política de pagamentos ao exterior, nomeadamente por via de acordos de intercâmbio de moeda, com Angola a tentar negociar em kwanzas e não em dólares; uma medida que a ser aplicada irá aliviar a actual pressão sobre o sistema bancário;
- Um novo Código de Imposto Industrial, em vigor desde Janeiro;
- E uma Nova Lei do Investimento Privado (NLIP), que entrou em vigor no passado dia 12 de Agosto, com o objectivo principal de captar mais investimento internacional, necessário para cumprir a meta definida pelo executivo angolano de captação de projectos de cerca 3 mil milhões de euros até 2017. Uma das condições para que isso aconteça é, desde logo, facilitar o repatriamento de capitais, tornando este processo mais célere e tendencialmente menos burocrático.
Um novo regime para o investimento privado
A NLIP prevê que o actual limite de 1 milhão de dólares, que dá direito a incentivos fiscais, possa ser reduzido para metade, pese embora esta redução favoreça apenas os investidores angolanos. Os investidores estrangeiros podem realizar projectos de valor inferior mas sem beneficiarem de incentivos fiscais.
Ainda no quadro da regra do “milhão de dólares” – uma regra que dificultava o repatriamento de lucros ou dividendos dos investimentos inferiores a esse valor – é de realçar que agora o repatriamento passa a depender apenas da execução do projecto e do cumprimento das obrigações fiscais e processuais e não do montante implicado.
Há uma clara tentativa de tornar os critérios de atribuição de benefícios e isenções fiscais mais objectivos e mensuráveis. No entanto, alguns especialistas defendem que, nesta matéria, a lei não é totalmente clara. Ainda assim, é possível identificar critérios gerais como: a criação de postos de trabalho; a localização do investimento; a participação accionista de angolanos; o valor acrescentado nacional; e a exigência da produção em causa ser destinada à exportação. O preenchimento destes requisitos dará lugar a uma redução gradual do Imposto Industrial, Sisa e o anteriormente referido IAC – uma redução que pode variar entre os 5% e a isenção total. Independentemente da sua forma, os benefícios fiscais não são atribuídos por mais de 10 anos.
A nova lei estabelece que os investimentos até 10 milhões de dólares passam a ser aprovados directamente pelo ministério responsável pela área à qual esse investimento respeita, deixando de ser necessária a aprovação do Presidente da República. Este passará a decidir apenas no caso de projectos superiores àquele valor. Tudo isto procurando simplificar o processo de decisão sobre o investimento, retirando dele intervenientes desnecessários e tornando-o mais célere. Com este intuito estabelece-se ainda a possibilidade dos departamentos ministeriais criarem serviços integrados de apoio ao investimento.
Também na mesma linha de redução de tempo e burocracia é criada a Agência para a Promoção do Investimento e Exportações de Angola (APIEX), em substituição da Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP). Esta vê, assim, serem-lhe retiradas algumas das suas anteriores competências, passando a focar-se mais na promoção externa do investimento.
Quanto a parcerias e sectores, é agora obrigatório que os investidores estrangeiros façam parcerias com entidades locais em sectores-chave, como o da água e electricidade, turismo e hotelaria, transportes e logística, construção civil, telecomunicações e tecnologia de informação (TIC) e meios de comunicação social. Estes são sectores considerados estratégicos, razão pela qual é necessário reservar um mínimo de 35% do capital a accionistas angolanos e garantir a sua participação efectiva na gestão do projecto.
É introduzida uma taxa suplementar de Imposto Sobre a Aplicação de Capitais (IAC) referentes à redistribuição de lucros e dividendos, sempre que ultrapassem os valores de investimento:
- 15% quando o valor excedente for até 20%;
- 30% quando o valor for entre 20% e 50%;
- 50% quando o valor excedente for superior a 50%.
Nenhuma destas taxas se aplicará em caso de reinvestimento no país.
Em matéria de aplicação, tratando-se de investimento interno, a lei aplicar-se-á apenas aos projectos de valor igual ou superior a 393 mil dólares.
Fora do âmbito da nova lei ficam os investimentos realizados por entidades que tenham mais de 50% do seu capital nas mãos do Estado (ou outras entidades públicas de natureza colectiva), as instituições financeiras e investimentos em duas áreas: a exploração petrolífera e a exploração mineira.
As empresas e investidores portugueses que continuam a trabalhar com o mercado angolano, quer por via das exportações, quer por via de investimentos directos ou indirectos, deverão estar atentas a estas alterações já em vigor e aplicáveis a qualquer investimento externo, independentemente do seu montante.
Também do interesse das empresas portuguesas que têm o mercado angolano como seu alvo prioritário é a nova linha de crédito. Disponível desde Maio deste ano, esta nova linha de financiamento de 500 milhões de euros (acordada entre diferentes entidades portuguesas privadas e públicas), destina-se a financiar o fundo de maneio de PME portuguesas que comprovem ter transacções comerciais com Angola (regra geral até um máximo de 1 milhão de euros por empresa). O financiamento é feito sob a forma de empréstimo de curto e médio prazo, com dois anos de amortização e um ano de período de carência.
Apesar de todas as dificuldades e desafios que Angola apresenta hoje, esta poderá vir a ser uma época de profundas transformações e relançamento da economia angolana, numa clara lógica de diversificação económica. Consequentemente, poderá representar oportunidades de negócio em diferentes áreas que não devem escapar às empresas e investidores nacionais.

