Médio Oriente - Um novo eldorado?

No Ocidente habituámo-nos, ao longo de décadas, a olhar o Médio-Oriente como uma terra de instabilidade, desde 1948 um campo de batalha entre o Estado de Israel e os seus vizinhos árabes; e a partir de 1979 e da revolução iraniana, um duelo entre o Irão Shiita e a Arábia Saudita sunita; acrescentam-se as intervenções norte-americanas contra o Iraque de Sadam Hussein, as guerras civis e fronteiriças do Iémen e da Síria, a interminável guerrilha entre o Governo de Israel e os palestinianos, com o Líbano a servir de campo de batalha. Tem sido esta a imagem – guerra, terrorismo, contraterrorismo.

Mas as coisas estão a mudar, e para melhor, graças a um esforço que vem, não de iniciativas internacionais, de organizações multilaterais, mas das lideranças locais. Estas fizeram um esforço de realismo político-económico, em que os interesses de cada Estado e das suas lideranças predominaram sobre solidariedades ideológicas de qualquer espécie, democráticas ou islâmicas.

Neste capítulo, talvez o fenómeno mais importante e interessante seja o apaziguamento das relações entre Riade e Teerão, sob os auspícios de Pequim.

Outro passo importante neste sentido de pacificação regional tinha sido aqui auspiciado pelos Estados Unidos, na Administração Trump, os chamados Acordos de Abraão, entre os Emiratos Árabes Unidos e o Bahrein e Israel.

Deste modo, como sublinha a capa da última edição de The Economist, há um “novo Médio Oriente” – mais pacífico, mais rico, a pôr cobro, por um lado ao sectarismo jihadista e, por outro a uma democratização determinada pelo Ocidente, mas talvez pouco apropriada à cultura da região. Este movimento está essencialmente voltado para valorizar e aproveitar em termos económico-sociais e, dentro do modelo político de “autocratismo pragmático”, os seus impressionantes recursos naturais em termos energéticos. Isto numa conjuntura em que a Guerra Fria Euro-América versus Rússia veio valorizar os seus hidrocarbonetos. A região representa 36% da produção petrolífera, 22% da produção de gás natural e respectivamente 46% das exportações de petróleo e 30% da exportações de LNG.

Os novos ventos na região têm a ver também com as mudanças profundas na ordem internacional que, depois do fim da bipolarização da Guerra Fria, do breve tempo da hegemonia americana e da correspondente ordem liberal internacional, caminha para um sistema multipolar de geometria variável, em que as grandes potências – Estados Unidos, China, Índia – e as médias-altas – Brasil, Turquia, Rússia, Alemanha, Japão, Reino Unido, Arábia Saudita – cada vez se pautarão mais por interesses nacionais e menos por ideologias ou solidariedades ideológicas. O que tem vantagens e inconvenientes.

Nesta mudança, o Médio Oriente é um protagonista simultaneamente activo e passivo: activo porque, com o seu potencial energético e com o seu principal concorrente, a Rússia, alvo de sanções, pode permitir-se avançar para a industrialização, além dos seus fundos soberanos irem alargando a participação e poderio pelos mercados mundiais. E também pode dar-se ao luxo de contratar para a sua Selecção nacional jogadores como Ronaldo. Passivo porque chega até ele a vaga multipolar, a partir do momento em que os “grandes” – Estados Unidos, China e Índia – estão a entrar neste registo.

Finalmente, como refere The Economist, há uma mudança em relação à instrumentalização ideológica, pelos poderes principais, de sextas colunas desestabilizadoras nos vizinhos: assim, quer o Irão por um lado, quer os Sauditas por outro, estão a baixar as intervenções desestabilizadoras na região, o que acalmou a guerra civil no Iémen e na Síria.

E este parece ser também o espírito das populações, que veem as questões económicas – custo de vida, emprego, paz civil – como as mais importantes. Como sublinha o The Ecnomist a este respeito, numa sondagem regional perguntando o que é mais importante, se ter democracia ou estabilidade, a segunda hipótese recolheu 82% das respostas.

Alcançada a paz e a estabilidade política, intervenções ditadas pela ideologia e a exportação ideológica parecem ter passado de moda nos Estados Unidos, hoje empenhados no conflito russo-ucraniano e internamente muito divididos para aventuras semelhantes à invasão do Iraque, a região do Médio-Oriente pode abrir-se à industrialização e à construção de infraestruturas de comunicação.

Tudo vai também depender, em última análise, da visão dos dirigentes da região, na sua maioria líderes de monarquias hereditárias ou repúblicas autoritárias, como o Egipto, face ao problema das profundas desigualdades sociais nestes países: ou uma linha desenvolvimentista esclarecida, procurando a criação de uma classe média que equilibre a pirâmide social; ou um autocratismo imobilista que mantenha a maioria da população em situações de penúria e sobrevivência, contrastando com a fortuna dos grandes.
Neste último caso, toda esta bela imagem e perspectivas podem ficar em questão.

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