O actual contexto mundial é revelador de novos equilíbrios entre as potências, surgindo os primeiros esboços do que parece ser o princípio de uma nova ordem internacional em termos políticos e económicos que dificilmente deixará de ter paralelo no plano comercial. O aprofundamento do processo de globalização e a dispersão de pólos de poder ganham expressão na crescente afirmação de actores como a China, a Índia, o Japão, a Indonésia (entre outros) que, de forma isolada ou em conjunto, vêm desafiando a tradicional hegemonia americana.
Mas se este é um quadro que em si não causa surpresa - desde logo porque se vem desenhando ao longo das últimas décadas - não se pode ignorar que ele ganhou um novo ímpeto com a chegada de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos (Jan 2017) e com a implementação dos principais eixos da política externa da nova Administração os quais, no seu essencial, assentam numa lógica de retrenchment e de rebalancing.
Significa isto, uma diminuição do envolvimento do país no exterior, ao mesmo tempo que se redefinem prioridades estratégicas com maior enfoque na região da Ásia-Pacífico em detrimento de outras geografias. Em ambos os casos, obedecendo ao imperativo de protecção dos interesses nacionais americanos, com expressão no conhecido mote “America First.”
No plano comercial, estas opções tem vindo a traduzir-se numa política e em medidas de índole proteccionista, com potencial - dado o peso sistémico do país - para provocar alterações significativas no comércio mundial e na liberalização dos mercados. É neste contexto que se entende a revisão do North America Free Trade Agreement (NAFTA), envolvendo o Canadá e o México, o anúncio da substituição do Acordo de Parceria Trans-Pacífico (TPP) por acordos bilaterais com os onze países desta região, a paralisia das negociações do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) com a União Europeia - que tinha como objectivo eliminar as barreiras comerciais (aduaneiras e não aduaneiras) entre as partes - e, mais recentemente, o aumento de tarifas alfandegárias sobre um conjunto de produtos chineses, numa postura tida por muitos analistas como beligerante em termos comerciais, e que levou Pequim a responder com a introdução de novas taxas sobre a importação de mais de uma centena de produtos americanos, numa escalada de tensões que resulta, hoje, num clima de pré-guerra comercial entre as maiores economias mundiais.
Estas medidas e a retórica comercial do presidente norte-americano têm trazido incerteza, aumentado o risco e minado a credibilidade negocial dos EUA - prejudicando e até mesmo hipotecando a capacidade de o país promover e liderar parcerias comerciais credíveis e duradouras no futuro - oferecendo uma oportunidade de ouro para a China se afirmar como líder do livre comércio.
Ainda assim, apesar das dificuldades e das ameaças à sua posição no contexto mundial, fazendo uso do seu posicionamento estratégico e dos seus vastos recursos (naturais e não só), os EUA permanecem um actor de enorme relevância política, económica e comercial. Neste último caso, será de reter que o país ainda detém uma posição dominante no comércio internacional, tendo ocupado, em 2016, o 2º lugar no ranking de exportadores, com uma cota de 9,1% do valor total das exportações mundiais, e o 1º lugar no ranking de importadores com uma cota de quase 14%, tendo, no seu conjunto, sido responsável por 11,6% das trocas comerciais mundiais. Ainda que provisórios, os números de 2017 apontam para que os EUA tenham conseguido manter estas posições, com um total de trocas estimadas em quase 4 triliões de USD.
Perante esta realidade, caberá aos investidores não se deixarem levar por cenários por vezes demasiadamente ruidosos que sobrevalorizam o caos de uma guerra comercial. É certo que é hoje mais difícil antecipar o relacionamento do país com o exterior, mas este não deixa de ser um mercado que continua a oferecer oportunidades de negócio e investimento. Aliás, o Presidente tem-se assumido como acérrimo defensor do sector privado e dificilmente fechará o país ao investimento estrangeiro. Os EUA são um dos maiores receptores de investimento directo estrangeiro (IDE) em todo o mundo, tendo sido o destino de 22,4% do total do IDE mundial em 2016. Independentemente da retórica, Donald Trump sabe que é necessário que assim continue a ser.
Neste quadro, a tendência será para que os EUA se tornem um mercado cada vez mais selectivo, o que vem tornar mais urgente a capacitação e preparação das empresas cujo objectivo é a internacionalização. Um esforço que passará por um conhecimento detalhado do mercado e capacidade de adaptação à maneira de se fazer negócios no país.
A inovação, a diferenciação, o cumprimento de elevados padrões de exigência continuam a ser requisitos obrigatórios para qualquer empresa e investidor. É importante ter presente que para entrar neste mercado é necessária uma capacidade de resposta aos desafios relacionados com a legislação, regimes fiscais, processo de desalfandegamento, redacção de contractos, entre outros. Trata-se, neste sentido, de um mercado inflexível.
Mas isso não significa que as empresas portuguesas deixem de olhar para o outro lado do Atlântico, apostando na exportação, no investimento e em parcerias estratégicas e inovadoras, principalmente em sectores como a energia, dos produtos industriais, bens de consumo e de equipamento e produtos agrícolas. Também o sector das TICs e o alimentar (sobretudo no seu segmento de “special foods market”) apresentam um potencial significativo. Novos conceitos, quer no plano industrial, quer no plano dos serviços, serão sempre bem-vindos num mercado com estas características e que continua a ser o maior destino das exportações portuguesas fora da União Europeia.

